segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Eis que adentro paredes de madeira quente.
Resultado de episódios rápidos e confusos
Cujas almas de tão bondosa calma e mente
Poram-me a mesa e a tagarelar picuinhas divertidas.
Entre risos e assuntos obtusos.

Era de um charme aconchegante e pomposo.
Não pomposo ás modas arcaicas. Céus,não!
Pomposo com a marca do suor sem remorso.
Em figuras de força que se prendiam nas paredes e teto,
Eram do mesmo calor que exauria de cada coração.

Foste então somente casa bonita e bem querida,
Não me daria metade interessado à sua ardência.
O fato é que, aonde eu mantinha a minha escondida,
Jorravam felicidade em dentes sinceros, em panos finos.
Que me pegava na mais estranha e vil veemência.

Tinham-me tímido e indisposto a muito além de uma simpatia.
Um caso curto, uma ritminha tímida dos desascendidos.
Quisesse eu ser um lirista, bêbado em tudo quanto é ritmia,
Mas eu apenas me concentrava aos modos com olhos finos
E aos momentos indescritivelmente curtos e compridos.

//


Mas há um detalhe não contado na trama
Deveras importante e consumado,
Foi o baque vil e quente feito chama
A me deixar zonzo e desnorteado.

No começo (ah, começo, seu maldito ingrato)
Foi discreto, imperceptível, curto
Reumido em um elogio bem intencionado,
Que do “eu são” preparavas o furto.

Sim, roubou a minha sanidade, apenas por um segundo
Talvez dois, até três, eu perdi a capacidade de contar,
Mas o fato é que a tal visão desfez as bases do mundo.
Olhos que me olhavam de baixo, assim como o falar.

Por vezes eu desentendia aqueles dizeres
E abstino-me de toda a responsabilidade!
Não tive culpa se estavas a me fazer
A dar aos teus olhos minha frágil sanidade.

//

São olhos distantes das tuas mãos!

Assim dizia minha mente pessimista.
Sim, pessimista. Não há lugar para otimismos
No antro das artes custosas das letras sangrentas.
Estão distantes! Estão distantes, eu disse!
Assim me confirmou uma outra voz, sorrindo,
Muito mais gentil do que eu ouse ser comigo.

Ignore-o! São olhos ao lado dos teus ombros!

Assim disse-me a mim em outro momento.
Se porventura fosse imune aos meus grilhões,
Estes pesados que me prendi para que não fugisse,
Eu descobriria a verdade da distância dos olhos.
Mais querido talvez que o quadrante do céu dos olhos,
Dos lugares aonde estiveram e pra onde se postaram.
Fosse, porventura, sabida de grilhões e espaços,
Teriam meus olhos um pouco mais de calma.

Para! Não lute na corrente de estrelas, mas nade!

Ou assim ainda penso, ao menos nos tempos
Que não estou fixo em estrelas, nas formas e cores,
Ou no broche vívido como um pássaro cor de bronze.
Penso em repousar sobre as marés e os ventos,
E torcer que uma estrela me carregue.

//

Mas seria assim tão simples?

É fato, é tato, ao que me diz respeito
Da figura forte e de cor quente,
Aquecida por panos finos ao pescoço.

Uma pele que parece quente como abraço
E forte como aço, forte e marcada
Com machas dos padrões que foi emancipada
Da dor das lágrimas de um qualquer moço.

Quando a vi sentada, pernas juntas, livro na mão.
A declamar versos sobre lembranças
Sobre como a memória dos seus dedos resistia,
De como rangia, aos versos, o berço capitalista.

É simples que por onde andas, me encontras
As vezes, as felizes vezes que apetecem.
É simples pois é sempre o mesmo sentido.
Por onde me encontras, docemente me faz
Ouvir as palavras que (acredite) me aquecem
E me esqueço das coisas por um estalido

Tu vais ao lugar com teus olhos e tuas bochechas.
A dar-me, bochecha a bochecha
O gosto de experimentar o cheiro da tua bochecha.

Fico com a sensação de estar leve na correnteza,
Flutuando calmo, vago, vazio e sem certeza
Que a estrela um dia toque em mim e fique presa.

//

Quando meu olho encontra teu olho
É olho sobre olho em cima de olho.
Você não percebe mas eu me encolho.

Das expressões naturais, do riso natural
Do jeito natural de agir natural.
Nessas horas eu até respiro mal.

Mas não é tristeza, não se engane
É um fascíneo tímido sobre as margens
Que eu odeio não saber reconhecer
Entre um riacho e uma correnteza.
Entre uma estrela e um cometa.

É quando eu fito, discreto, sua cintura nua
Sua nuca, a forma com que prende o cabelo,
Como caminha e como tento adivinhar como respiras.
Sua boca, imaginando a delicadesa ou o fervor do teu pranto.

Uma nobreza sem escudo, sem sangue pintado, sem broche bordado.
Somente uma vida atritante, pulmão cheio e lábio suado.
Sem sonhos doces, coloridos, impossíveis e adocicados.
Somente a simplicidade e as mãos firmes que esqueceram os antepassados.

//

É verdade, porém, não me iludo.
Que tal sentimento, além de mudo.
É faca.
Daquelas que podem entrar
E sem que se perceba cortar
Por debaixo da pele, paciente
Cortando pele e cortando mente,


Essa faca não tem baínha
É como vara sem linha
Corta, sem nos deixar ver
E crer que nos corta.

Mas acredite, nos coloca
Sobre os domínios da dor
E quando temos ciência
Não há clemência. Só amor.

Mas não, essa faca está guardada.
Entretanto basta um descuido,
Um deslize, um pequeno escorregão.
E a faca corta fundo e sem perdão.

//

Junto à mesa, eu haveria de reconhecer
Todos os sentdos da minha vivência.
Eu me sento como um burguês sonso,
A fitar as panelas e adivinhar os cheiros.

Quando sento, sou vítima do devaneio
Não sei se penso na comida
Ou no pensamento do amigo alheio.

Coicidência, no dia que estavas a mesa
Pensei na sua boca, na sua bochecha
Nos seus ombros, no seu cabelo.
No que pensavas, no que faria,
Pra quem olhava, no que diria.

E disfarçado de um elogio
Ainda que totalmente sincero.
Apresentei-me, do meu jeito
Desse jeito que eu nunca quero.

Como um ser tímido das artes verbais,
Que não consegue ver a marca da guerra
Nos olhos das almas que guardam
Cicatrizes e crateras das violências.

//

Infelizmente só consigo te reduzir a grossa arte.
De ofício fraco e rimas simplórias.
Porque só o poeta maldito tem noção
Do quão grosseiros, rasos e simples
São os seus versos.

Maldito? Perguntas.
Sim! Maldito
Daqueles com ânsia de sol nascente,
Daqueles que o peito é leve ao crepúsculo.

Outros te diriam palavras mais doces,
Simples, talvez, é possível
Mas te dariam a doçura de liros mais calmos.

Só que diante deste meu respirar pesado,
Deste mundo bastardo, destas engrenagens
Que enferrujam nossas tardes preguiçosas
Como poderia eu ser doce?

Que escolha teria eu
Além a de ser uma alma vil, uma alma rústica,
Que não pode conceber-te a beleza de uma flor
Ou beleza qualquer outra senão a beleza da força?

Eu nunca poderia chamar suas bochechas de rosas
Ou seus olhos de luzes, ou sua voz de um canto doce.
Minha poetice maldita só me deixa admirar
A sua expressão enquanto mulher, mulher viva.

//

Eu só posso oferecer as luzes pálidas do sereno
E o calor das noites de verão, de peles suadas.
Sou maldito e não saberia ser menos ameno
De falar o improvável nas horas mais erradas.

É fato, entrentato, que nunca perco um movimento
Das suas curvas, imaginando a sua temperatura.
Enquanto sua boca se mexe, delicado momento,
Acompanhando aonde a sua mão se situa.


Temendo a faca eu creio permanecer calado.
Admirando o crepúsculo quieto me posto
E a esperar a oportunidade de sentar ao seu lado
Para discretamente olhar pintas do seu rosto.

A minha esperança é que eu possa ser contaminado
Pela energia que exalas quando fala e sorri.
E voltar a olhar para mim mesmo, quando calado
E saber, mesmo que raramente, que comigo estou aqui.

//

O que brilha não são as artes gentis. Olhos doces não me dizem nada,
Prefiro me perder em olhares que me dizem mais.

No que é complexo demais pra ser doce.

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Monólogo Último do Navegante

Não cruzarei o istmo, nem aquém
Farei meu sacrifício. A dor do mar
Convulso aflige os débeis braços que
Me pesam, e que invejam o albatroz
Sulcando o ínvio azul. Não, nem o vórtice,
O escolho e o pélago profundo temo,
E a morte que o oceano urde em seus
Abismos: o erodir eterno e frio
Da areia em minha carne; o julgamento
Vazio do olhar de peixes a meus ossos;
O céu no escárnio à luz de escamas. Não.
Assombra-me o momento do abandono:
A quilha em escombros; o sextante baço;
Silêncio a inflar minha mortalha ao mastro.
Eu sei, somente este timão em lascas
Aplacará a tormenta; apenas mãos
Atadas apaziguam os deuses. Ó,
Ulisses, quando avante à tua Ítaca
Sonhada te lançaste, contra a fúria
E ardil infesto do abissal Poseidon,
Mais livre foste que jamais será
A humanidade, e mais divino o mar
Em teu caminho que o cruel Elísio.
O céu é breve no horizonte, o azul,
Infindo, e o odor de terra me inebria.
Somente sou minha memória agora,
Agora em que o horizonte e o mastro marcam
O instante da ablução - em que o infinito
Se encarna na dissolução. Acaso
Entenderia a água o intento
Humano de acossar aquela linha
Evanescente para sempre além
De seu desejo? Não. Eu tenho por
Irmãs as nuvens que se impelem rumo
Ao seio do absoluto. Mas, que diz
O mar? Que tudo acaba. Esse instante
Craveja em minha carne; o derradeiro
Momento, o último. Que há além?
Que há aquém? Somente o instante imóvel,
Irresoluto; e nele, eu, soluto.
O ar adensa. Aqui embaterei a hora
Em que a procela engolfa a luz final
E o raio inscreve contra o turbilhão
Das trevas meu destino amaro e a chuva
Encobre o espaço amplo que me resta,
Trazendo vivo o uno inevitável.
Não há de me encontrar a aurora, nem
Me agraciará o sol de um novo dia,
Porém, perante a imensidão do Todo,
Abarcarei o Nada inabalado.


sábado, 21 de junho de 2014

Noite de Névoa

Em noites como esta, quando o silencio é só
E a rua turva com a névoa empresta aos postes
Um claro fosco de sonhos esquecidos,
Ponho-me à janela, cachimbo em mãos como luneta,
A entrever no espelho baço da cidade
Algum sinal de vidro iluminado,
Ou sombra vagueando o espaço indefinido,
Como se dormisse algures este alguém que pensa
E logo ali estivesse a realidade.


terça-feira, 17 de junho de 2014

Espelho d'Água

Meu toque é falso nesta pedra,
Ela desconhece minha presença.
Constroi-se somente em minha ausência
E ignora a vontade que lhe estendo.

É falso pois lhe dou o que não pede,
Sede impingida pelo orvalho.
Cruel a face que se força cega
Ao espelho que era outrora apenas água.

sexta-feira, 30 de maio de 2014

O Agouro

Os olhos são lodos profundos de vazio,
Seu corpo um entoado de tristeza corrente.

Assim como o ar, é frio e cortante. Solitário.
Quieto. Só fala diante do maior absurdo.

Suas plumas negras, de nobreza noturna
Misturam-se ao corpo da penumbra.

Errantes malditos, bailarinos dos mistérios,
Girando suas graças soltos na bruma.
A dor e a morte são seu império,
A lágrima e a memória são a sua pluma.

É dentre os mortais, o agouro mais medonho.
Sua presença, o caos para todo que o avista.
Exceto a feliz coincidência, eu suponho,
De quando pousou nos umbrais daquele artista.

terça-feira, 20 de maio de 2014

Sobre a Ponte de Pegas

Deixe, peço, que estas lágrimas que tanto te revoltam
Despertem de seu sono e nos despeçam apenas
Quando a lembrança amarga da revolução dos astros,
Como um augúrio impresso ante a migração do sol,
Entreponha após o desenlace de nossos dedos
A realidade intransponível da memória
E do desejo.

(Inspirado na lenda chinesa de Niu Lang (Vaqueiro) e Zhi Nu (Fiandeira), escrito pós a leitura de um poema anônimo chinês, aqui traduzido do inglês)

Longe e longe está a Estrela do Vaqueiro,
clara e clara é a Garota Fiandeira.
Alva e delicada, suas mãos se movem
ziguezagueando no tear.
Ela não termina uma peça num dia
e suas lágrimas fiam-se abaixo como chuva.
O Rio Celeste está claro e raso;
Não há nenhuma distância entre os dois.
Através das águas transbordantes
a Fiandeira olha com amor silente


domingo, 27 de abril de 2014

Spirit's Palestine

That was not a pilgrim's journey, inside
His eyes. The wind over the holy land,
Whispering dry conclusions to his dreams,
Burned in earthly fire the pray on his lips
And lifted to heaven the sterile intonations
Of the sand.
"That is a souls-ridden land."

Love spoke and died before the infinite
Of the desert; his tears did not suffice
To fill a pond for his urged reflections.
His inward eyes had foretold him the end:
He lacked a passion enough to name a god
Upon his death, or else a crucifixion,
Nailed at fast, on self and soul's intersection.
He sighed:
"It is a robber's death at last."