Outrora em uma noite quieta e sonolenta,
Quando o silêncio sob os sonhos se prende:
Palco de uma história mórbida e sangrenta
Foi o apartamento de um amigo de mim antes presente.
Em seus pensamentos perdidos na cama estava
Quando se prestou a um banho noturno,
Que talvez lhe desse o sono que almejava,
Mal sabia do tal momento inoportuno.
Quando se despia de costas para a porta trancada
E cantarolava uma música popular dos tempos de criança
Ouviu, de leve, um som de voz que o assustou como pancada
E que em breve da própria vida lhe tiraria a esperança.
Parado e assustado ficou imóvel, a coragem lhe faltava.
Mas breve a razão voltou a seus pensamentos e pensou:
“É apenas minha mente, como quando jurei que o abajur
dançava”.
Certo e confiante, sua alma finalmente se aquietou.
Entretanto, novamente voltou ao ar, gélido e pesado,
A mesma voz que assoprava acima do ar como vento,
Congelando a sua alma, que somente ficou ali parado,
Desejando ser mentira tão pavoroso momento.
Quando o pavor se tornou desespero, reagiu:
Virou-se disposto a saber que era a tenebrosa alma,
Que só podia ser de um ser perturbado e senil,
Disposta a vir perturbar sua vagarosa calma.
Diante dele estava ali, claro como o ato de viver,
Uma sombra sem fundo, no espelho postada,
Tamanho o susto que nem se pôs a entender
Tal figura que no espelho permanecia parada.
Para o inferno foi o seu pobre e frágil coração
Quando a sombra decidiu, morbidamente, se mover.
E quando percebeu ser inútil o terço e a oração,
A dúvida sobre a origem da sombra começou a crescer.
“Sabe falar, criatura que me visita sem ser chamada?”
E a sombra, delicada, respondeu: “ao amanhecer”.
Que deverá tal coisa significar? Será uma charada?
Um código? Uma pista? Que quer tal coisa dizer?
“É um demônio? Ou um anjo, qual teu nome? Me fala!”
Movendo-se, ainda mórbida, a sombra, como antes,
Responde: “ao amanhecer” e de repente se cala.
Tão absurdo quanto pensar em sombras falantes.
“Que quer dizer tal coisa? Que faz diante de mim?”
A sombra então move-se do espelho para fora.
“Por favor, Senhor Meu Deus, terá isso um fim?”
Gritava ele com uma voz apavorada e que agora chora.
A sombra andou por todo o lugar batendo as portas,
Quebrou cada vidro, tombou cada coisa, gritando
Em um volume infernal, em cordas velhas e tortas,
Enquanto o pobre homem no chão estava chorando.
Choro interrompido quando a sombra o ergueu
Apenas estendendo a magra e negra mão
E que não estava mais em sua sala ele percebeu,
Mas perdido em um vácuo, gritando em vão.
Em pranto ele gritava, se debatia parado no ar:
“Diga, demônio, ou que quer que seja, o que quer?”
A mesma reposta misteriosa ele foi ganhar
Enquanto a sombra tomava a forma de uma mulher.
Caiu no chão de repente, estava em sua sala, meio
dormente
Enquanto as paredes que jorravam algo de cor virulenta,
A sombra, agora mulher, aproximava-se lentamente,
Com uma boca enorme e uma respiração curta e lenta.
Assustado, correu até a cozinha e de uma faca se
apoderou:
Não a sombra, mas o próprio pescoço era seu alvo.
E com um rápido movimento a própria jugular cortou,
Daquele insano pesadelo estava, enfim, a salvo.
Ao amanhecer, a polícia visitava o silencioso e destruído
apartamento,
Tão chocante e misterioso aquilo que havia sido
encontrado,
Tudo estava destruído, cada vidro quebrado, tamanho era o
desolamento:
O meu amigo, com o pescoço aberto, embaixo do chuveiro
ainda ligado.
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