segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Regresso

Tornou-se o céu tão claro agora,
Tão intocavelmente leve
(Demasiado tarde, demasiado breve)
Que o vazio pesou em minha mente
E lançou-me a ele relutante.
As incontáveis aves que criei,
Regressando de seu voo inquieto
Revolvendo aquela imensidão humana,
Voltaram sem achar nenhum descanso
E pousaram solitárias em meus ombros,
Pesadas, pálidas, pensativas
Dos desvelados anos de perjúrio,
Sem trazer ao bico alguma rama,
Sem trazer-me à alma algum repouso.


segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

No meio de todo esse calor
E todo esse sentir
No qual estamos imersos

Peço perdão, meu amor
Por te diminuir
Para caber em meus versos


domingo, 8 de dezembro de 2013

À Costa II

À orla retornaram as ondas, intrigadas,
Sem encontrar ali qualquer barreira.
Dissolvera-se a areia;
Entregara-se por inteira ao mar.
Desperta o sol junto ao olhar -
Recolhem-se as água, e, ao longe,
Contemplam, juntamente à costa,
O leito à orla em que o luar lhes conjugou.


terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Scepticism en Scene

A dew-drop of thought spred its ficiton on the fog.
A half-conceived vision fought to stand unstrained
With its feet fixed over the grey slippery froth.
Hands caught the reins of rain while something sat
Upon the rolling straddle of the sea's silvery cloth.

The scene was set, conceivable enough,
Constructed with concrete conjuring words, or ought,
Though now considering this after-thought
It seems the scene dissolves and what's left of it
Is the gleam of watery words and hiss of slithering mock.


domingo, 1 de dezembro de 2013

Paraíso Reconquistado

O verde sobre o qual te assentas
Gotejou das folhas que te cobrem,
Folhas da árvore em que te recostas,
Mãe do inviolado fruto revigorado
Que tuas mãos graciosamente cuidam
E intrigados olhos inquirem
Qual sangue há concedido
O rubor que se reflete em seu candor.
Pode primeiro esta iridiscência
Ter doado a cor de nosso sange?
Pode a maculada seara de Cain
Conceber a semente desta sombra?
Que são estas ramas? São?
Não colhera o verdor do chão,
Apregoara-lhe no céu e te esquecera?
Firmara ressequidos galhos nesta árvore
Com a inconsciente violência de uma imaginação ingênua?
Soergueu esta mesma árvore morta por repouso
E engendrou em olhos enclausurados
Verdejantes vícios visionários?
Deixe que o roçar desta casca áspera
Reconduza o horror a tua pele
E o calor da areia corroa o sono de teus pés.
Teu dormir é um presságio de uma morte eterna.
Desperta: a miragem do deserto é teu desejo;
Segue-a.


Anima Mea

Não caminhes sobre o crepúsculo, alma minha,
A queda é mais violenta e mais cruel.
Deixe que o alvorecer se estenda
Num amanhã de um lado ao outro;
Não o atribule com preocupações perenes;
Não pergunte por que deixou a noite,
A noite somente é ele em outro tempo
E nele não há tais tribulações.
O que quiseres saber, alma minha,
Não o deves, tem um gosto
Desconhecido e assaz dormente.
Quando te encontrares à meia-luz
Perguntarás a direção do dia:
Mas é uma pergunta inconsequente,
A resposta já a precedia.


terça-feira, 26 de novembro de 2013

Elísio

Aquela sombra conquistou sua evanecência.
Por demais lutou contra a força de enformá-la,
Esta ideia do sol de uma indelével vista -
Inflexível vazio que logra o inverossímil.

Evanescendo, do crepuscular violáceo,
Agora um transparente pássaro assentado
Sobre a lua, cantando em silentes estrelas
Sua verídica composição do dia.

É a lua um rememorar do sol, no qual
Meandros de seu movimento perpetuam.
Sua memória é sua ideia em movimento,

Assim como a verdade é um esquecimento:
Elusiva lembrança que a beleza encontra
Vislumbrando a elisão na memória do mundo.



O Seu Beijo


Não exagero quando digo que um poema é pouco
Para expressar a preciosa e tão cara sensação,
Que tenho quando, feliz e ainda meio louco,
Sinto que sou tocado nos lábios e no coração.

Já é tamanha a demasia de imagens e sensações
Nos teus olhos que me invadem de mansinho,
Devagarinho me aquecendo, ou as emoções
Que tu guardas atrás do semblante delicadinho.

Meu anjo, que carregas contigo em tão ardentes
Lábios para que tenham ao toque esse poder?
Que segredos guardam toques leves tão quentes
E carinhos tão doces, que minha alma fazem ferver?

No teu sorriso, tão lindo, tão doce, tão sereno,
Eu esqueço de pensar por um breve momento.
Pois perto de você meu coração é mais ameno
Esqueço de qualquer dor e de todo sofrimento.

As nuvens, intensas, que me adentram o peito
E me abrem os olhos para uma toda nova certeza,
Fazem-me cada dia mais querer repousar no teu leito.
Você, meu anjo, é um rio e seu beijo a correnteza.

domingo, 24 de novembro de 2013

Favola del Fabro

Um pequeno pássaro,
Fugindo a um negro gato,
Tornou-se a lua.

O incansável gato,
Para alçar ao inalcançável pássaro,
Tornou-se a noite.


quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Brown Birds

End-day's rain falling silently surprises
The brown birds of tomorrow's morning boughs.
Bow down, rain, passing those wings; they are your
Earthly ascending siblings of a subtler
Divinity than ours. Remark those hours
Of sleep as you remark the earth you meet.
In death they still sing, not in muttering
Miracle, but in that mute principle
Of all ends. They merely rest from their dreams
In the morning, in their boughs of thought-weaved
Leaves of heavenly mind, as a mystery
Disclosed under clouds. Fall, rain, and as you
Fall, revere that revery, which dreams of all.

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Dédalo

Inquiro cada entrelaçada linha
Que não vejo, translúcida que traz,
Ao sol, de um céu a um eu o meu desejo
Desconhecido, transladado incauto,

Tornado em mim um riso irredimível
Do superior temor não vislumbrado
Mas sentido: criei tais laços ou
Tais olhos cegos? - ou inquiriria:

O mar ainda expulsa estas imagens.
Permanecem, porém, em meio àquele
Vapor dos sonhos distendido contra

Os pensamentos que, propensos, calam-se
E caem sobre a terra - ou cairiam,
Tivesse eu força para derrubá-los.


A Sombra


Outrora em uma noite quieta e sonolenta,
Quando o silêncio sob os sonhos se prende:
Palco de uma história mórbida e sangrenta
Foi o apartamento de um amigo de mim antes presente.

Em seus pensamentos perdidos na cama estava
Quando se prestou a um banho noturno,
Que talvez lhe desse o sono que almejava,
Mal sabia do tal momento inoportuno.

Quando se despia de costas para a porta trancada
E cantarolava uma música popular dos tempos de criança
Ouviu, de leve, um som de voz que o assustou como pancada
E que em breve da própria vida lhe tiraria a esperança.

Parado e assustado ficou imóvel, a coragem lhe faltava.
Mas breve a razão voltou a seus pensamentos e pensou:
“É apenas minha mente, como quando jurei que o abajur dançava”.
Certo e confiante, sua alma finalmente se aquietou.

Entretanto, novamente voltou ao ar, gélido e pesado,
A mesma voz que assoprava acima do ar como vento,
Congelando a sua alma, que somente ficou ali parado,
Desejando ser mentira tão pavoroso momento.

Quando o pavor se tornou desespero, reagiu:
Virou-se disposto a saber que era a tenebrosa alma,
Que só podia ser de um ser perturbado e senil,
Disposta a vir perturbar sua vagarosa calma.

Diante dele estava ali, claro como o ato de viver,
Uma sombra sem fundo, no espelho postada,
Tamanho o susto que nem se pôs a entender
Tal figura que no espelho permanecia parada.

Para o inferno foi o seu pobre e frágil coração
Quando a sombra decidiu, morbidamente, se mover.
E quando percebeu ser inútil o terço e a oração,
A dúvida sobre a origem da sombra começou a crescer.

“Sabe falar, criatura que me visita sem ser chamada?”
E a sombra, delicada, respondeu: “ao amanhecer”.
Que deverá tal coisa significar? Será uma charada?
Um código? Uma pista? Que quer tal coisa dizer?

“É um demônio? Ou um anjo, qual teu nome? Me fala!”
Movendo-se, ainda mórbida, a sombra, como antes,
Responde: “ao amanhecer” e de repente se cala.
Tão absurdo quanto pensar em sombras falantes.

“Que quer dizer tal coisa? Que faz diante de mim?”
A sombra então move-se  do espelho para fora.
“Por favor, Senhor Meu Deus, terá isso um fim?”
Gritava ele com uma voz apavorada e que agora chora.

A sombra andou por todo o lugar batendo as portas,
Quebrou cada vidro, tombou cada coisa, gritando
Em um volume infernal, em cordas velhas e tortas,
Enquanto o pobre homem no chão estava chorando.

Choro interrompido quando a sombra o ergueu
Apenas estendendo a magra e negra mão
E que não estava mais em sua sala ele percebeu,
Mas perdido em um vácuo, gritando em vão.

Em pranto ele gritava, se debatia parado no ar:
“Diga, demônio, ou que quer que seja, o que quer?”
A mesma reposta misteriosa ele foi ganhar
Enquanto a sombra tomava a forma de uma mulher.

Caiu no chão de repente, estava em sua sala, meio dormente
Enquanto as paredes que jorravam algo de cor virulenta,
A sombra, agora mulher, aproximava-se lentamente,
Com uma boca enorme e uma respiração curta e lenta.

Assustado, correu até a cozinha e de uma faca se apoderou:
Não a sombra, mas o próprio pescoço era seu alvo.
E com um rápido movimento a própria jugular cortou,
Daquele insano pesadelo estava, enfim, a salvo.

Ao amanhecer, a polícia visitava o silencioso e destruído apartamento,
Tão chocante e misterioso aquilo que havia sido encontrado,
Tudo estava destruído, cada vidro quebrado, tamanho era o desolamento:
O meu amigo, com o pescoço aberto, embaixo do chuveiro ainda ligado.

sábado, 16 de novembro de 2013

Olhos

Olhos que olham e nada veem
Fixos, paralíticos, aterrados
Sob uma chuva que tornou-se pó
Ao recusar-se a cantar
A ouvidos que não mais ouvem
A antiga linha que os liga aos céus
Do imaterial tornado moções dos ares
Cristalizado em cânticos antifônicos,
Moções dos mares miraculosos
Que embalam a morte e os mesmos mistérios
Que eram a vida dos olhos:
Celeste sabedoria desconhecida
Dos ares traçados pelos mares.


quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Uroboros

Recuso-me e me aparto da memória
Não remida; partida, sou-me em parte
Alguma procurando devorar-me -
Retorno tarde e encontro minha vista

Consumida em meus olhos consumados.
Cerro-os cego de horror, mas não se apartam:
São parte de meu rosto irresoluto
E não renegam seu labor eterno

De encontrar-me. Há qualquer coisa nesta
Serpe que serve a si somente, sem
Sorver à saciedade o que é ofertado -

Remoe-me e regurgita, mas não morre;
Espalho sobre o espelho cada entranha
E trago, pouco a pouco, o que me resta.




quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Em mim



Eu já estive em Paris. Já visitei a Grã Bretanha e conheço toda a Europa. Andei por todo país e vi cada cultura.

Presenciei cada feito, eu vi cada homem em cada momento de grandeza, em cada capítulo de sua estranheza tornar-se mor. O homem de cada religião brilhar no antro da sua fé, o homem de cada nação morrer com a glória junta ao pé.

O homem pobre que braveja a sua dor e o que se vende por menos luta, o burguês cruel e o burguês-nádegas, eu vi todos e os homens que os imortalizaram na sua cruel labuta de sátiro-concordar.

Eu vi cada pedaço de mundo, e vi cada mundo. Vi os mundos inventados, os mundos que mentes geniais ou insanas criaram, vi também os mundos dos romances, contos e poemas.

Estive em todo lugar, em todo mundo, em todo o mundo. Estive no princípio, na mentira e no fim.

Irônico, eu nunca estive mim.

À Costa

És bela, e este momento tão belo é
Que ergue armas contra todo o Universo,
E neste embate em que a vitória do incerto é certa,
As exiladas ondas onde a realidade impera
Rebentam contra a rocha de um amor sentido,
E refugiam-se atordoadas em contradição,
De como pode uma moção tamanha
Ser conquistada incautamente
Pela ilusória praia de uma paixão.


terça-feira, 22 de outubro de 2013

Dupla Prosódia


Dedico minha vida inteira,
Sincero, direto e cru,
A encontrar a melhor maneira
De te mandar tomar no cu.

Quem nega a poesia do escarro,
Não vê o verme que está a roer
Suas vísceras, que em versos amarro
E em cima vomito, só pra te ver sofrer.

Do teu lixo o que mais me assusta
É como tua lógica é turva e lerda.
Não enrola e me diz quanto custa
Pra eu poder te mandar a merda.

Se só conhecesse o verso pomposo e de brilho,
Um cego será e a noção não poderá ter,
De que assim como teu pai, teu irmão e teu filho,
O mimo e a merda são parte do teu ser.

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Thoughts of a Later Hour

A light that has flickered and failed;
A light conceived as gone;
Lightning the flame of a broken candle
Upon this marbled floor.

Why this upon this hour
When I find myself without
The strength to blow that fire aflame
Or blow that candle out?

I find myself without a name.
I fear
I do not reckon myself here;
I do not find myself as one.

Wreckage cast out from the sea,
Returned ashore,
Who once sailed alone
From this marbled floor.



Loucura


Preso e confinado
Em sua existência engaiolada
A todos finta sério. “é um louco”
-Dizem com a alma desesperada.

O sangue na sua testa,
Sua solidão desenfreada
É sua marca de inquietude
Diante da plateia sempre inflamada.

E insistem na ideia, que é um ser absurdo
No íntimo de sua mente completa e fechada,
Enquanto marca a castigada parede,
Cada marca uma violenta cabeçada.

É a mais cruel e mais absurda
A imagem por todos relatada.
Mal sabem tais moribundos
De sua natureza decretada.

Aquele é somente um homem,
Comum em cada camada.
Pega-te e te tire a loucura,
Não te sobras mais do que nada.

terça-feira, 15 de outubro de 2013

Sombra Triste


Há uma sombra triste em cada um de nós
E a tal da tristeza é o que nos sustenta.
Sujos, baixos mesmo quando sem voz,
Sorrir e o riso nos abre uma fenda.

Somos todos uma sombra solitária,
Que se presta, quando num monólogo lento,
A mentir-nos a natureza bestiária,
A convencer: são os outros o desalento.

Nossa carne é suja, podre é a nossa alma.
Santo é o verme que nos rói em silêncio,
Tal que nossa doença não lhe tira a calma.

É da nossa sombra que vem o prenúncio,
Que nos traz a morte quando ergue sua palma,
Àquele que do seu odiar é cônscio.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Mirror on a Mirror

Mirror on a mirror laid,
I am a shadow of it all,
One another's shade
In between compressed,
Reflecting a thought
Of a desire
Of a self
Of myself
In fall.


sábado, 21 de setembro de 2013

A Pérgola

Acima há uma pérgola de pálidas
Flores na qual a luz de um invisível
Sol espalha-se, débeis luzes cálidas
Que aquecem o chão gélido e insensível.

As sombras sobre o chão ao vento dançam -
Mas não há vento que atravesse o triste
Vazio; só há sombras que as luzes lançam,
Sobre uma pérgola que não existe.

E quando a noite silenciosamente
Cai sobre insones olhos já cansados,
E as pétalas em ramos estrelados

Fremem, em redor sente-se envolvente
Somente o frio, as dores, os horrores
E o vazio - "Mas, ah! aquelas flores!"



sábado, 24 de agosto de 2013

Ulysses

Minha tradução de Ulysses, de Alfred, Lord Tennyson.

Ulisses

Pouco proveito traz que, um ocioso rei
Junto à lareira, em meio a estes penhascos áridos,
Unido a uma idosa esposa, eu meça e imponha
Leis desiguais por sobre uma selvagem raça,
Que dormem, e devoram, e me desconhecem.
Eu não descanso da jornada: beberei
A vida até o sumo: Sempre desfrutei
Pleno, pleno sofri, ambos junto daqueles
Que me amaram; sozinho, junto à costa, e quando,
Por céleres correntes, as chuvosas Híades
Molestaram o mar turvo: tornei-me um nome;
Pois, sempre errando com um coração faminto,
Muito vi e conheci; cidades de homens
E costumes, concílios, climas, governos,
Eu mesmo não menos, mas honrado por todos;
E bebi o prazer da guerra com iguais,
Longe nas tormentosas planícies de Tróia.
Eu sou uma parte de tudo que encontrei;       
Mas toda experiência é um arco pelo qual
Cintila o inexplorado mundo cujas margens
Vanescem para sempre e sempre quando avanço.
Quão tedioso é parar, chegar a um término,
Enferrujar sem lustro, não brilhar em uso!
Como se alento fosse vida! Vida sobre
Vida foi muito pouco, e de uma p'ra mim
Pouco resta: porém cada hora é salva
Daquele sempiterno silêncio, algo mais,
Um portador de coisas novas; e vil fora
Por três sois resguardar-me e poupar a mim mesmo,
E este espírito cinza ansiando em desejo
Seguir sabedoria como a uma estrela,
Além do limiar do pensamento humano.

    Este é meu filho, meu próprio Telêmaco, 
Para quem eu concedo o cetro e a ilha,-
Meu filho amado, discernindo p'ra cumprir
Este trabalho, com prudência tornar brando
Um povo rude, e pouco a pouco, lentamente,
Subjugá-los ao proveitoso e ao deleitável.
Inocente ele é, centrado na esfera
De deveres comuns, decente a não falhar
Em gestos de ternura, e pagar         
Adoração devida ao deuses familiares,
Quando eu for. Ele faz sua parte, eu a minha.

    Lá jaz o porto; o barco infla suas velas:
Lá escurecem os vastos mares. Meu marujos,
Almas que labutaram, pensaram comigo -
Que sempre com alegre acolhida abraçaram
O trovão e o fulgor do sol, e opuseram     
Corações livres, rostos livres - somos velhos;
A idade tem ainda sua honra e afã;
A Morte tudo acaba: mas, antes do fim,
Algum trabalho nobre, deve ser feito,       
Ainda sendo homens que andaram com Deuses.
A luz começa a cintilar por entre as rochas: 
O longo dia acaba: a lua sobe: cavos
Murmúrios se assomam com muitas vozes. Venham,   
Não é tarde p'ra procurar um novo mundo. 
Empurrem e, sentando em ordem, embatam
Os ressoantes sulcos; meu intento é
Navegar para além do pôr-do-sol, e os banhos
Das estrelas do ocidente, até que eu morra. 
Talvez os golfos venham a nos afundar:
Talvez encontraremos as Ilhas Alegres,
E veremos o grande Aquiles, que conhecemos.   
Muito se fora, muito ficou; e apesar
De não termos aquela força que outrora
Movia a terra e o céu, isto que somos, somos;
Uma índole igual de heróicos corações,
Fracos pelo tempo, mas fortes em vontade
De lutar, procurar, ter, mas jamais ceder.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Os Mercadores

São dois homens, talvez dois mercadores,
Figuras negras contra um rubro céu
Que morre. Não há sol; um turvo véu
Cerceia o horizonte e derredores.

Nada ouço que dizem: se rumores
Valores ou saberes, não sei eu.
São sombras, afinal, cada um com seu
Destino, suas cargas, suas dores.

Os mercadores permanecem quietos,
Talvez assim entendam-se, talvez
Não haja nada mais a ser falado.

Ao fim do dia seguem seus trajetos,
Despedem-se e cada um, por sua vez,
Retoma suas dores e seu fado.


sábado, 3 de agosto de 2013

The City in the Sea

Minha tradução de 'The City in the Sea', de Edgar Allan Poe.


A Cidade no Mar

Veja! A Morte a si mesma ergueu um trono
Em uma estranha cidade jazendo em abandono,
Longe, absorta no sombrio Oeste ermo,
Onde o bom e o mal, o pior e o superno
Partiram a seu descanso eterno.
Lá santuários e palácios e torres
(Torres que não tremem, pelo tempo carcomidas!)
Não se assemelham a nada que é nosso.
Em torno, por congregantes ventos esquecidas,
Resignadamente sob o firmamento,
As águas jazem em desalento.

Nenhum raio do santo céu invade
A longa noite daquela cidade;
Mas a luz do lúrido mar dormente
Flui sobre torres silenciosamente -
Cintila sobre os cumes livremente -
Sobre domos - sobre espirais - sobre salões reais -
Sobre templos - sobre babilônicos umbrais -
Sobre a muito esquecidas sombrias pérgolas
De esculpida hera e flores pétreas -
Sobre muitos e muitos altares divinos
Cujos engrinaldados frisos fazem unidos
As vinhas, as violetas e os violinos.
Tal se fundem torres e sombras em tal lugar
Que tudo parece oscilante sobre o ar,
Enquanto de uma torre orgulhosa
A Morte olha abaixo monstruosa.

Lá, templos e túmulos abertos, rente
Escancaram-se às águas reluzentes;
Mas nem as riquezas que lá tem abrigo
Em cada olho diamantino -
Nem o morto ornado de alegre enfeite
Tenta as águas de seu leito;
Pois nenhuma onda se agita
Por sobre a imensidade vítrea -
Nenhuma ondulação diz que os ventos possam estar
Nalgum longínquo e alegre mar -
Nenhum suspiro insinua que os ventos tenham estado
Em mares menos hediondamente parados.

Mas veja, um distúrbio está no ar!
A onda - lá está a tremular!
Como se as torres houvessem empurrado,
Ao afundar um pouco, o mar parado.
Como se os cumes houvessem debilmente dado
Um vazio sobre o Céu velado.
As ondas agora brilham com mais rubor -
As horas ofegam débeis e sem vigor-
E quando, em meio a não terrenos, murmurantes tonos,
Lá embaixo aquela cidade achar paragem,
O Inferno, surgindo em um turbilhão de tronos,
Prestar-lhe-á sua homenagem.

quarta-feira, 31 de julho de 2013

Were I

Were I thy hand, thy soft, lascivous hand,
  That glides and swerves along thy snowy breasts:
  A snake that savours every grain of sand
  Upon thy flesh and on thy thighs there rests.
Were I thy lips to taste thy trancelike kiss
  When uncontroll'd by love and lust and fire
  Of passion, thou art lost in an abyss,
  So I would quench thy wish with my desire.
Were I thy soul to know the mystery
  That sets thyself awake and what sweet thought
  That burns within thy bosom; would I be
  Thy every wish and love, but I am not:
     I am thy lover, and suffices me thee
     Love and for evermore thy lover be.

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Soneto para um movimento a ser denominado 'Arvrismo'

Virente mar, por pássaros singrado!
Frondosa fronte, árvore divina,
Em cujos ramos rútilos a sina
Humana encontra um leito p'ra seu fado.

Contemplai seu verdor iluminado,
Mais magnânimo do que a campina -
Cada folha, uma doce dançarina;
Cada galho, um Atlas encantado!

Ó, vasta, verdejante catedral!
Em cuja arquitetura natural
Medito infindas horas deleitáveis.

Fera forma em que ruge a natureza!
Ó, ático semblante, Ó, beleza
Plena de mudos sonhos inefáveis!

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Carta a uma Amigo Poeta

Amigo, me disseste, "irei dispor
Em versos toda a nossa amizade,
E cada verso adverso seu compor
Com rimas de amical rivalidade".

Sou grato ao seu desejo de tornar
Divinas tais tribulações efêmeras;
Por imortalizar a sinfonia
Do ambíguo poetar de duas vidas.

Porém, amigo, peço-lhe que deixe
De lado nossas rimas assonantes,
Que em cujos chiaroscuros mal conversam.

Verdade, não há muita consonância
Em nossa poesia. Deixe estar:
Nossa amizade rima em versos brancos.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

A Palavra Amor



A palavra saudade não cabe no mundo,
Porque transcende o imaginar.

A palavra medo não cabe em nós,
É muito pequena para significar.

A palavra beijo não cabe em um momento,
Porque a cada momento vai se recriar.

A palavra amor sim, essa sempre cabe.
Cabe exatamente em todo lugar.

O Sonhador

(Soneto escrito inspirado no quadro Der Träumer ("O Sonhador"), de Caspar David Friedrich)
 
O Sonhador

A sombra de um crepúsculo dourado
Descansa em um violáceo anoitecer,
Lançando seus suspiros de prazer
Sobre a pulsante rocha do passado:

Encantada janela!, onde, assentado,
O Sonhador esquece o alvorecer,
Em seu torpente anseio de entrever
Na Natureza um sonho matizado.

Naquela incerta meia-luz, silêncio
É o som maior: o céu não traz mais aves,
A mente, pensamentos. Tudo está

Na escuridão guardado, está suspenso,
Aguardando ansiosos os suaves
Despertares que a aurora lhes trará.

sábado, 6 de julho de 2013

Ícaro

Ícaro, sabe-se, voando aos céus,
Às asas de seus pais, do azul caiu
Ao outro azul abaixo, pois subiu
Àqueles outros céus que não os seus.

Porém, não disse: "É meu fado! Deus,
Por certo, em meu orgulho consumiu
Minhas penas, lançando-me ao vazio;
Cabe ao Celeste Ser os Apogeus!".

- Solitário a singrar a amplidão
Resplandecente, cujo brilho encerra
O peso do saber da solidão -

Não. Mas aquele pássaro pensou,
Vendo o horizonte: "Voei junto ao sol;
Não há mais nada a se ver na terra".


domingo, 30 de junho de 2013

O Poema


Eu olhei para o Poema, o Poema olhou pra mim.
Prestamos a nos olhar, num diálogo sem fim.

Eu li o Poema. O Poema, de pronto, me leu.
A ponto que não sabia o que era Poema e o que era eu.

Eu sorri, e a lágrima o olho rapidamente solta.
E o Poema logo depois (juro!) sorriu de volta.

sábado, 29 de junho de 2013

O Dragão sob a Montanha

(Uma tentativa de imitação do verso anglo-saxão, acredito que seja o primeiro poema que escrevi)

Sob a sombra da montanha, || serena a neve jazia
Sangue e cinzas ao chão, || o som do pranto se erguia
Fumaça e fogo aos céus, || a face do rei sem vida estava
Morte! Morte! Ao demônio alado, || em mágoa gritava um jovem
Parado em pé, || perante o horror que seus olhos viam
E o dragão desvanecendo no céu, || dirigía-se ao topo da montanha
Erguendo sua espada furioso, || ao encontro do verme correu
Montanha acima movia-se lentamente, || a morte lhe inflamava o coração
Avante avistou a grande besta, || alva como o branco à sua volta
O que buscas, criança? || Questionou o animal
Retornei com tua ruína, || respondeu o jovem
Vim vingar o meu povo, || verme assassino
Teu sangue será meu || e só então descansarei
Por que te precipitas? || Pediu o dragão
Tens certeza em sua busca? || Será correto o que procuras?
O monstro que queres matar, || não é aquele que morto está?
O animal que assolava esta terra, || não é aquele que queres vingar?
Sobre sangue e crueldade || seu povo reinou
E com medo e morte || manchou este lugar
Criaturas cruéis, || criminosos e assassinos
O destino os devolveu || a desolação que causaram
Mas a mesma morte que os cercava || mostra-se em teu olhar
Podes tu puní-los? Podes tu julgá-los? || Perguntou o jovem
Em silêncio subiu o dragão aos céus || sem responder tal indagação
Rapidamente retornando de onde viera || tal como repentinamente surgiu
E o jovem jazia ponderando || que julgamento o destino lhe traria


sexta-feira, 14 de junho de 2013

Memento Vivit

Sobre a muralha da Imortalidade,
Renascido, assentava-se observando
Os fragmentos humanos caminhando,
Rindo no êxtase da Eternidade.

Corpo a corpo, o tropel da Ebriedade
Seguia a si, cego, rejubilando
Sobre o pó, em  feridos pés dançando
A dança una da Mortalidade.

Indiferente ao vento torturante
Sobre a desolação cinzenta e fria,
A inconsciente multidão seguia;

Sobre a gélida rocha lancinante
Angustiava-lhe um pesar profano,
Uma saudade de ter sido humano.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Elegy for an Era

An old tradition have laid on his bed.
Tired of word-making and world wrought to best,
He laid his head. "Let him there, let him rest.
I do not think (I hope not!) he is dead."

His blind eyes of Homer, his aureole,
Rest, too, beside his heart (let us wait, let
Her make our bed) and on his hands are set
His Roman staff of rule, his capital.

But now we wait to uncover her eyes,
To unconver her hair and hands and sighs,
To uncover what was unknonwn by light.

At night we'll know what was by light unknown.
At night we'll know if should we crave for dawn.
At night we'll wait. At night we'll wake. At night...
Após a noite fria
Cobrimo-nos com cobertor alheio
E nossos pés estão gelados.

quinta-feira, 6 de junho de 2013

A Tempestade

Aqueles frágeis galhos desconhecem,
Tocados pelo divinal temor
Da turbulência do calvário, a dor
À voz dos sacrifícios que perecem,

O fero aflar das asas que estarrecem
Tróia e o eco que ecoa pelo horror
Do inaudito Verbo criador
Que engendra os frêmitos que os entorpecem.

O céu expurga sua violência
Sob a quietude pálida do nada
Descendo do celeste eterno drama

Por galhos de inconsciente reverência
E Árvore por eras assombrada
À folha arrebatada junta à grama.


Ser é um ato de poetar



O humano nasce opaco,
Sem a forma a contornar;
Nasce tosco, nasce caco,
Algo que ‘inda irá formar

E se conhece vazio,
Sem um chão, ou nome. Claro
Como um quadro anil.
Tal, perdido e sem preparo.

Vai encontrar a essência,
Vai humano se chamar,
Quando de si for vidência,

Que ser é um ato de amar,
E muito mais que aparência,
Ser é um ato de poetar.

quinta-feira, 30 de maio de 2013

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Ironia


Ironia é uma terra de pesadelos forjada por seres de sonhos.

Ironia é tal qual tu anseia se soltar do que te enoja
E sem nem perceber que aquilo te persegue,
Faz do teu coração um ninho, nele se aloja.
Logo a diáspora tua alma, cega e surda, segue.

Ironia é um mar de entranhas sob um céu de carmim.

Mesmo que se desprenda das labutas de ser fera,
Logo teu coração por uma calma implora.
E nesta terra de feras, tudo aquilo que dura uma era,
É porque abriu mão de ser o que foi outrora.


quarta-feira, 22 de maio de 2013

Retorno

Do âmago do solo irrompe e orna
A Natureza em sua refulgência
O ímpeto cativo da violência
Que novamente à terra negra a torna.

A Natureza sua fronte adorna
Sobre o sangue que irrompe em reverência
À eternidade da primeva essência
Que novamente aos níveos céus retorna.

Inspiro o Verbo assolador - denodo
O fulvo fio que encanta meu viver -
Possuo toda terra sob mim, todo

O tempo em meu olhar. Cerram-se já
Meus olhos no negror do anoitecer
E toda terra sobre mim está.



segunda-feira, 20 de maio de 2013

Poetar


Poetar não é difícil, não é dolorido
Mais que qualquer fazer.

Poetar não é sublime, nem milagre,
Ou qualquer outro parecer.

Poetar não é (só) doce ofício,
Nem (só) um caminho do autoconhecer.

Poetar é por em frente o processo,
É alimentar o ato de viver.


domingo, 19 de maio de 2013

Imortal



Ás vezes acho que sou imortal.


Morro todo dia de desgosto.
Morro toda vez que não amo.
Morro toda vez que não declamo.


Mas não me sinto imortal porque ainda passo a viver,
Mas porque esqueci como é morrer.

domingo, 12 de maio de 2013

Idependency

(Um lampejo poético completamente incomum, a respeito da Guerra de Independência Americana)

Independency

Irony is
The iron in
Your arms
Forgetting
The iron in
Their arms.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

Canção da Alma

Que é cantar senão a expressão
Da alma? Esta, assomo de impressões
Profundas que, por entre a imensidão
Cerúlea, inunda-se em sensuais canções.

E quem, em abundantes profusões,
Sucumbe à silenciosa comoção
Do transe desta dança de emoções?
Pergunte à inquieta folha do verão,

Cantando trêmula a composição
Sinfônica das ternas estações
Eternamente junta à relva ao chão;

Pergunte a ti, a ti que estas questões
Consomem e inocentemente são
As notas dos humanos corações.


quinta-feira, 18 de abril de 2013

Como eu li o Poeminha do Contra


A todos vocês de alma perdida
Que tentam me tirar moral:
Sua arte será esquecida,
A minha será imortal.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

A Torre

Aquela velha torre em mim perdura:
Com sua rocha ao tempo indiferente
E rija, enquanto em derredor, fremente,
A corroída e rude terra endura.

Estéril terra: enquanto ainda dura
Meu tempo, penso nesta fera gente
Que rasga e rói meu corpo ferozmente
E ignora que esta torre em mim perdura.

Ao céu anseia e alça seus pilares,
E ao sol que põe, seu cimo resplandece.
Porém eu sei - decrépitos altares -

Também estéril é aquela torre,
Que brota e cresce insólita e escarnece
De tudo que em mim cresce, sonha e morre.


terça-feira, 9 de abril de 2013

On Inspiration

Coleridge had his visions;
Yeats had his ghosts;
I have but the ilusion
That life is yet not lost.

O Monstro Cruel


Outrora distante, como conta uma lenda,
Uma criatura assustadora se ergueu.
Tão cruel, aprisionava a todos na fenda
Da montanha fria, funda, de onde apareceu.

Jamais algo tão violento se conheceu,
Mesmo o bravo guerreiro que a espada brilhou
Mirando o monstro. Bradando, não estremeceu,
Pronto para a batalha que ele provocou.

Durante o combate, o herói triunfou.
A máscara do monstro havia se quebrado,
Revelando seu rosto triste, que chorou.
Marcas profundas de seu amargo passado.

E fugiu correndo o tal monstro, derrotado.
Logo o guerreiro, pensativo, percebeu:
Aonde o desamor fora (sutil) plantado,
Também a crueldade, de pronto nasceu.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Meu Anjo



É tamanha intensidade,
Pulso interno que corrói.
Produto desta saudade,
Que por dentro tanto dói.

Sei que você desconhece
Esse motivo de pranto.
É só meu, não transparece.
E se perde em todo canto.

Tu, minha musa, meu anjo.
Que vive no meu pensar,
Esse meu tal desarranjo,

Se por ti eu for lembrar
Que seja um rearranjo
Pois sem você, irei chorar.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Lines Written on Imitation of Yeats

When I am old I will have known
Of all there is of art and song.

Then I will cry, when I be done,
For I forgot my heart was young.

Diálogo entre Ser e Sombra

Vagava à sombra e minha sombra ao sol;
Perguntei: "por que é a luz que tua via
Traças se és noite e a noite foge ao dia?"
Solene, respondeu-me: "porque sou;

E apenas assim sou, por que amou
Aquilo que eu era o que eu seria;
Pois o cálido dia, à noite fria,
No ardor do enlevo álgido, esposou.

À manhã sigo sobre o que já foras;
À tarde vago sobre o que serás;
À noite estou em ti e em mim estás.

Sou-te e tu és-me sob o andar das horas.
Ao meio-dia, quando as sombras somem,
Resta fúlgida tua essência: o Homem."

O Sorriso do Artista


O Artista adorava sorrisos, escrevia
Sobre como gostava de sorrir.
Se estava triste, somente sorria,
Era sua arte, seu ofício de sentir.

Escrevia sobre prazeres e cantos,
Sobre tudo que sabia e sobre nada.
Tantos eram seus ais, seus encantos,
Que cheio de sorrir a todos contava:

“Vale mais na vida perder o ar
Para ver o Sol lento se pôr,
Que se arrepender de amar
E não saber se seria siso ou dor.”

Mas o concreto o engoliu, subitamente
O Artista não agrada mais, e já não come.
A sua arte, tremenda, das valas da mente,
Foi devagar sendo vencida pela força da fome.

Hoje o Artista mudou, tornou-se dentista.
Vê sorrisos o dia inteiro, muitos eram tais.
Com a frase na parede: “Nunca desista”.
Mas o Artista, não sorriu. Nunca mais.



domingo, 24 de março de 2013

Perverso

Perversidade é a arte de versar,
E é o maior prazer para o perverso
Tornar o mundo todo seu inverso
E esconder em seus versos cada par.

Cada verso é um pecado singular:
É o vero de sinuosa via emerso;
É a vaidade de todo um universo;
É o vento em seu enlevo de assomar.

Seu reverso é a arte do poeta;
Seu converso é a arte do profeta:
Sabendo ao mundo sendo solitário.

Sua essência é a ausencia de seu ser:
Almejar à alma que almeja nascer
É ser completamente seu contrário.

segunda-feira, 18 de março de 2013

Finnegans Wake

Tradução da primeira página (página 3, na verdade) de Finnegans Wake, último "romance" do escritor irlandês James Joyce, tida como a obra mais incompreensível da literatura mundial.

   "riocurso, passado  Eva e Adawn, da curvatura da costa à borda da baía, trás-nos port um vícius comodo de recirculação de volga a Howth, o Castelo e Envoltórios.
    Sir Tristram, violator d’amores, evindalém do curto mar, hadia passangora rechegado da Armorica do Norte nesse lado do peschoso ístimo da Europa Menor para reilutar sua penisolada guerra: nem hadia rochas de tãopessoar pela corrente do Óconee exagerado a sinh mesmas para os gargiosos do Cundado de Laurens enquanto elas iam doblindo seu mumpero todo o tempo: nem mavoz longígnea subrou mishe mishe a tauftauf tuéspeatrick: não ainda, apesar de cerdo apphós, hadia um cabralha traiceirado um velho ceigo isaque: não ainda, apesar de turdo ser justo in vanessia, eram irmãs sósies terriveumente irothas com geumois nathandjoe. Uma pipa estrouge do malte do pai tivesse Jhem ou Shen brumentado sobre a arcoluz e rubriende ao arkho-osísis seria visto anelante sobre a aquaface.
  A queda (bababadalgharaghtakamminarronnkonnbronntonnerronntuonnth-
unntrovarrhounawnskawntoohoohoordenenthurnuk!) dum autrorua muro mansião compainheiro é recondada cedo na cama e mais tarde na vida através de todo o cancioneiro cristão. A grande queda domuralho gerou em tão curto prazo a quidram de Finnegan, que era-se um homem solido, cujo humpetocabeço de símeosmo pruntamente um unquerito ao oeste manda em demanda ao seus tumbtytumtões: e seu cimatornapiquepontoespaço está nocouteiro no parque onde laranjas foram colocadas para jazer sobre a gramo deusdes que diablens primeiro amaram livvy."

sábado, 16 de março de 2013

Cotidiano



Houve um tempo de glória, bem me lembro.
Bem distante no tempo, se bem me lembro.
Como ruí tão depressa, eu não lembro.
Dias aqueles de tardes de setembro.


Eram retumbantes os gritos do amanhecer,
Curtos e precisos, meus olhos iam acompanhar.
Banquetes de ironias, overdose satírica, gargalhar,
Razões para jogar a voz fora e depois esquecer.


Não eram dias de luta, eram dias de provocar,
E se saísse do tom, pouco importava, achava eu,
“Só parar para tentar, o Sol de novo vai voltar”.
Eles riam todos, mas eu sabia o que era meu.



E o que permitiu esse gozo sair de mim?
Terá sido uma piada sem graça de Deus?
Terá sido natural os tais pesadelos meus?
Poderei esperar que como noite, terá fim?


Terá um fim, eu sei e será muito breve.
Cansei de esperar que enfim caia neve
Nessa fornalha de tragédias, podridão,
E dor, parado sozinho aqui neste porão.


Tão simples quanto rápido, serei breve.
Antes que a sinfonia de vez se encerre.
Um puxão e o Sol voltará, quero que quebre
Esse crepúsculo, vou gritar e me sentir leve.

domingo, 3 de março de 2013

Amanhã


- Olha como o céu tá bonito hoje. Preto com vermelho.

Sentou-se na grama e sentiu a brisa,
Lembrou-se de ontem, que triste.
O vórtice dos olhos se vê vazio de novo,
A mente assovia, não mais existe.

Som do vento, som de vento, vem cá.
Vem brincar comigo, doce querido,
Tá tudo tão alegre, tão bonito,
Como se nada tivesse existido

Ele não quer mais ficar aqui,
Ele quer se desprender do chão.
Querida árvore, me ajude,
Só dessa vez me estenda a mão.

Som do vento, som do vento, adeus.
Vou ficando calado, só com teu sussurro,
Tá tudo tão errado, tão estranho,
Devagarinho ficando mais, mais escuro.

-É. Hoje  o céu tá bonito. Queria poder vê-lo amanhã

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Poeminha dos Pessoa


“Tua arte é tão bela, tão maravilhosa
Que pelo vento, eternamente ressoa.
Tua mente tão vasta, tão geniosa
Que não cabe em um só Pessoa.”




quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Lágrimas sob o Por Do Sol


Ela apoiou o rosto no meu, levemente
E me olhou nos olhos, dizendo-me
E explicando-me, calmamente
Os versos de uma canção deprimente.

Toquei sua nuca, o cabelo macio
E sedoso por entre meus dedos,
E a poesia me ardendo profundamente
Nos lábios e no meu peito ardente.

Beijei-a de leve, tudo ia devagar
Como se o tempo, pudesse esperar.
A nossa volta o mundo girava
E nossas bocas, somente dançavam.

Diante de nós o céu laranja, imortal
Figura celeste das nossas imperfeições.
A cidade, amolecida e decrépita gemia
E nossas almas, ignoravam, apenas.

Dias seguiram e o agouro chegou.
No mesmo banco eu de novo choro,
Dessa vez sem rosto de apoio, solitário
Meu choro, sem lábio de cura, sem nada.

O rosto dela que foi embora me chamava,
Gritava por socorro, queria meu abraço.
Mal sabia minha pobre alma desfalecida
Que havia sido enganada pela saudade.

O vento ainda ressoa, mesmo que mudo agora,
E o céu laranja ainda reina, mesmo que pálido,
E as palavras dela ainda vagam minha memória.
“Você está errado, meu amor, eu vou embora”.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Definição, pobre definição



O tesão é um hálito ácido e quente
Que percorre as narinas e coça a garganta,
Descendo pelo peito te queimando os lábios.

Os lábios são muralhas que precisam cair,
Tornar-se úmidos e macios para poder
Subitamente, mas muito quietamente,
Cada tendão vivo se arrepiar.

O arrepio é uma canção, algo rápido
Que nos faz cantar bagunças e repúdios.
É talvez uma pureza áspera, encardida,
De alguém que pede por um contato.
Bem sei, contudo, que é uma canção.

A canção é, antes de tudo, poesia.
Todos cantam quando entregues,
Quando sujos, cansados e suados.
Queremos sangue, queremos gritar,
Enquanto gozamos alegres, e pouco
Ligamos para o que é amor.

O amor é algo oculto.
Oculto como poesia, como arte.
O amor é tudo, somos nós
Na nossa plenitude.
O amor é um hálito ácido e quente
Que percorre as narinas e coça a garganta
Descendo pelo peito te queimando os lábios.


terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Infortúnio Solitário

"Poema que abre uma obra que comecei nomeada "Saga dos Vermes". Espero que gostem."


A neblina que é solitária adora me visitar,
Mesmo quando estou parado esperando um sol.

As incontáveis vezes que dormi faminto
Ou encharcado de saudades e desejos
Nunca compensaram os dias de companhia.
Não sei bem de quem, algo muito superficial.

A cerveja parece sempre mais quente, o cigarro mais vagabundo,
A grama menos verde, com perdão do clichê horrível.
Shakespeare parece piadas ruins de boteco
E Vivaldi parece rangido de giz no quadro negro
Ou um gato torturado com lâminas mal afiadas.

Ás vezes dá uma vontade de esquecer tudo
De aprender tudo de novo, como a ingênua criança
Que ainda não vê o câncer do mundo.

Todo dia aprendo a mesma coisa, a mesma pauta, a mesma lição
Que esqueço todo dia quando ironicamente esboço um sorriso.
A vontade de construir um reino com as próprias mãos
E a lição de não se erguer um mero tijolo, do mais leve.

Maior inimigo é o espelho, tanto o que mente quanto o que revela.
O gosto de amargo no final da vida é sempre o mesmo.

Sempre acabo indo dormir cedo
Depois que a televisão enjoa de mim.

Já ouvi que uns negaram a melancolia, talvez estejam certos,
Ou estão olhando o espelho errado, como eu
Quando gastei muito tempo enxergando anjos brincando nas campinas.

Para terminar essa putrefação tanto de espírito quanto de arte
Deixe-me, por favor, só essa vez, rimar.
Dessa lama, o nobre e o verme, qualquer um faz parte
E eu como verme, aprendi onde é meu lugar.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Around the tree of Life a lake there lies
Of fearful flames and tender waves of ice
Where in one essence both were intertwined
The sinuous rivers of the Heart and Mind.
The fire can not undo the ice, nor might
It be extinguished, neither can the Night
Embrace all stars with darkness, neither may
The Light all conquer with her charming ray.
For thus is Love's dominion, where the roots
Of Life's tree dwell, for evermore sweet fruits
And flowers breeeding. There, at Beauty's songs
Unheard of Passion fair all Nature throngs;
Along, amidst the eternal ice and fire
Walks hand-in-hand with yours my love's desire.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013


A ti que praguejas o meu nome,
Que me desejas dor e fome,
Não te guardo nenhum rancor
Pois não sinto teu mesmo amor.

Mas ainda alto eu enfatizo
Que de mim não terás dor.
Sou forte, não preciso
De bengala ou de senhor.

E você, bicho do imaginar,
Dito “senhor” do infinito,
Se meu dono estás a se declarar
Eu vos declaro meu inimigo.

domingo, 6 de janeiro de 2013

O sentimento de que tua mão luta para alcançar o fim.
E devagar vai morrendo, lentamente padecendo o seu paraíso de carmim.

E o ritmo louco, bombando e badalando o suspiro.
Devagar se aquietando, ameaçando o outrora enfurecido.

Por que não diz com todas as letras o que pretende?
Talvez devesse me ensinar esse jeito de amar, que só um anjo entende.

Não me deixe sozinho na labuta de pensar. Na tortura de uma cabeça, apoiada junto à mesa, da dor a descansar.
Entorpece-me cada mal entendido que plantas, como teu passo me encantas e teus mistérios me põem a pensar.

Tamanha é a ingratidão que tu regas sobre minha cabeça, uma ideia que nem mesmo o mínimo transpareça.

Essa insônia que alimento pensando no que poderia ser. Ajuda a ler as palavras que o céu em trovões tenta me dizer.

E com uma resposta cruelmente confusa, tu me põe a escrever. A criar esta arte fraca, no meu dolorido oficio de sofrer.

Talvez você nunca entenda o poder presente no teu agir, de esclarecer o mais escuro céu ou de fazer qualquer alegria sumir.

Se sou mesmo um pináculo de saberes como tu apresenta, diga logo aquilo que todo poeta sonha,com qual toda dor se isenta.
Mas bem sei que quando ri não é comigo, que quando goza não sou eu teu amante, mas meu verso galopante, não mente nem que eu queira.

No final tu me provas de novo quão cruel é a verdade, quão crua e seca se faz a realidade.

Mesmo chorando por dentro você ri e me espanta teu poder de fingir. Ainda se culpará pelas dores que não evitou, mas verá que a arte que iniciaste já se cessou.

Com o corpo pairante sobre o véu das estrelas tu acordará e a lágrima, no delicado rosto, escorrerá e teu arrependimento tão breve não cessará. Já estará dormente teu poeta admirador e nada restará, para ambos, além de saudade e muita dor.

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Conheci-te em um tempo de mudanças,
Onde teu sorriso era mais belo
E tua lágrima mais afiada.
Tu conheceste o amante que revelei
E mesmo apaixonada recusou,
Pois a tua prisão de ilusões era forte,
Até demais para te deixar pensar.
Você amou o quadro que pintei em teus olhos
E se derreteu nos confins que te abalei.
Teu corpo encontrou paz em meus braços,
Teus ouvidos em minha poesia, teu dançar em minha música
E tua boca no imaginar do meu beijo,
Mas tu optou pelo seguro e se deixou perder,
Sufocou teu desejo em beijos podres
E matou o sentimento em abraços falsos
Mas te desafio a matar teu amor.
Nunca poderá sufocar a verdade.
Porque nos confins da tua alma irão residir os versos que não poderá negar,
Mesmo quando viver sobre o amor de outro.
Beijar uma boca bárbara e sem paixão,
Tu saberás que minha boca dominou teus sentidos.
Você irá deitar-se sob outro corpo,
Arranhará outra carne e gritará por outro nome.
Mas minha mão repousará em teu rosto
E saberá que em teus sonhos eu sou teu íntimo da noite.
Você agarrará outros lábios e seus dedos se cruzarão com outros dedos no espaço,
Mas saberá que meu rosto e minha poesia que te farão contar e pintar o quadro do mundo.
E no final teu respirar ira ser mais intenso e minha imagem estará lá, enquanto te entregas aos pesares que te calam.
Enquanto não parar de amar, ouvirá meu nome sussurrando baixinho o teu nome delicado.
E quando finalmente sorrir de volta, o quadro das memórias irá sumir, em um corpo sem forma