terça-feira, 12 de julho de 2011

Ecos

Ecos

Posicionou o papel e a caneta de maneira agradável sobre a mesa, ajeitou-se de maneira que as idéias fluíssem melhor, bebeu um gole de sua bebida. Pensou, pensou, pensou, ponderando palavra por palavra que se formava sem agarrar-se a nenhuma. Levantou-se, foi em direção à janela e abriu a cortina para que a luz iluminasse seus pensamentos. Estava nublado.

Olhou em volta, para sua prateleira, seus livros. Folhear algum em busca de inspiração? “Um leão que copia um leão se torna uma macaco”. Uma gota de tinta é suficiente para começar um quadro. Uma palavra, apenas uma palavra...

Parou. Maravilhado pelo pensamente que lhe ocorrerra. Sim, era isso que procurava. Sem perda de tempo tomou a caneta em mãos, posicionou o papel, curvou sua cabeça e pôs-se a escrever as palavras que lhe surgiam:

Posicionou o papel e a caneta de maneira agradável sobre a mesa

Genial! De todas as linhas escritas que lhe rodeavam não se recordava de ter visto semelhante entre elas. Mas o que significavam? Digo, aonde levariam? Talvez não significassem, não no momento, pelo menos, mas ao menos era um começo. Então o que? “Então” certamente seria uma ótima palavra para ser posta subseqüentemente, demonstrava que ele possuía total certeza do que quer que ele viesse a por depois dela. Fato é que não tinha, então abandonou a idéia.

Idéia. Talvez ele pudesse trabalhar com a idéia da “idéia”, isso seria uma boa idéia, talvez como ela era produzida ou como a melhor maneira de produzi-la.

ajeitou-se de maneira que as idéias fluíssem melhor

Alegrou-se novamente pelo que havia produzido. Que maneira agradável, como teria descrito seu personagem, de começar um texto. Sentiu sede, levantou-se e foi buscar algo para beber. Talvez devesse escrever sobre isso, acrescentar mais naturalidade ao seu personagem, e por que não emprestar suas próprias ações a ele? Afinal, a arte imita a vida.

Ações, ele precisava de ações! Pôs-se a descrever o que seu personagem fazia seus pensamentos e o ambiente ao seu redor. O que ele fazia? Escrevia, naturalmente, era o ele estava fazendo desde o princípio. Mas escrevia sobre o que? Ainda não havia decidido, não sabia se seria importante, mas talvez fosse bom ao menos escrever uma linha, apenas para aguçar o leitor. Talvez seu protagonista escrevesse um conto? Algo a ser ponderado. Aproveitou e transferiu suas dúvidas ao seu personagem acompanhadas de uma metáfora de autoria própria para demonstrar suas capacidades criativas como um escritor genuinamente original.

Sim, ele escrevia um conto, e o que escrevia naquele exato momento era:

Posicionou o papel e a caneta de maneira agradável sobre a mesa

Espere! Aquilo não era original! Ele mesmo havia escrito aquelas exatas palavras três parágrafos acima. Ou será que seu personagem havia escrito primeiro e era ele que apenas o estava copiando, afinal, a vida imita a arte.

Não! Estava divagando, precisava se concentrar no seu trabalho. Chegou à conclusão de que deixaria daquela maneira mesmo, as pessoas irão rir da estranheza que essa passagem provocará, genial!

Parou por um instante, assustado por seus pensamentos. Sentia uma estranheza ao pensar, como se o que pensasse já tivesse sido pensado por outra pessoa, ou pior, que seus pensamentos não passassem de uma mera personificação de suas próprias ações. O que seu personagem escrevia ele tinha certeza de que ele mesmo havia escrito, mas o que ele havia escrito não seria apenas uma copia do que ele havia feito?

“Talvez alguém esteja escrevendo sobre meus pensamentos”, pensou. Começou a gargalhar nervosamente pela absurdez e o estranhamento que aquele pensamento lhe provocara. Mesmo assim, não conseguia voltar a escrever, se sentia sufocado, preso dentro de um círculo que ele mesmo havia criado. Como ele poderia viver novamente o que ele já havia vivido? Isso era absurdo, nem ao menos fazia sentido!

Ele precisava de uma palavra, apenas uma palavra, e toda aquela angústia iria embora...

Levantou-se e foi embora.

Sorriu aliviado ao contemplar o que havia escrito, finalmente quebrara aquele círculo vicioso que se alimentava de si mesmo. Mas, por outro lado, sua estória parava ali, ele não sabia por que havia escrito aquilo, escreveu por mero desespero. Nem ao menos fazia sentido! Um fragmento solto em uma estória inacabada. Talvez ele devesse apagar esta última linha e reescrevê-la. Mas ele ainda sentia que tudo o que havia escrito era apenas uma cópia de si mesmo. Talvez ele devesse apagar tudo e escrever algo novo. Algo novo? Como ele saberia que seria algo novo? Como ele saberia que a estória de sua estória não seria apenas a história de sua história? Não é a história apenas a própria história repetida? Ou uma estória repetida?

Não chegando à conclusão nenhuma e se perdendo em pensamentos desconexos, tomou a única decisão que conseguiu conceber: levantou-se e foi embora.